ESCULPIR O ESPAÇO-TEMPO
No dia 25 de janeiro de 2017, o físico, o químico e o popularmente conhecido como o poeta da termodinâmica Ilya Prigogine completaria cem anos do seu nascimento. Cem anos é tempo suficiente para o surgimento de novos costumes, de novos anseios e de novas temáticas sociais e superações. Num tempo transcorrido e tarkoviskiano, Ilya Prigogine esculpiu uma das mais audaciosas contribuições para o desenvolvimento da ciência, reaproximando dois mundos, dois universos, dois olhares que a herança cartesiana rompeu. Esculpiu um mundo permeado de incertezas, flutuações e irreversibilidades. Um mundo onde a busca de inteligibilidade coincidiu com os valores éticos e morais da humanidade. Lapidou uma ciência que não fala mais em determinismos e nem em reversibilidades. Transformou a noção de tempo em uma pintura realista, objetiva e unidirecional.
O século 20 foi cenário de grandes transformações sociais. Prigogine nasceu no coração da revolução Russa, em 1917, na cidade de Moscou. Cresceu em um ambiente no qual a revolução provocou um grande abalo global na velha ordem capitalista socialmente estabelecida pós-revolução francesa. Mas o século não se caracterizou apenas por essas transformações sociais, a ciência naufragava em uma grande crise que abalou profundamente conceitos fundamentais estabelecidos durante os três séculos seguintes à revolução copernicana.
Nas duas primeiras décadas do século 20, a ciência foi marcada pelo desdobramento da física quântica e da física relativística. Cada qual se desenvolveu e gerou o abandono das concepções clássicas de trajetória e simultaneidade, respectivamente. Em paralelo a esses novos desenvolvimentos da ciência, a termodinâmica ficou refém do fracasso de Boltzmann em explicar mecanicistamente a irreversibilidade do tempo por meio do conceito de entropia.
Desde o desenvolvimento maciço da termodinâmica (em meados do século 19), esta visão de ciência estabeleceu confronto direto com toda herança newtoniana em relação às leis reversíveis da natureza. Com a elaboração dos dois princípios da termodinâmica, esta ciência se afirmava capaz de se desenvolver independentemente das concepções mecanicista, tornando-se um dos pilares que sustentam a inteligibilidade do olhar humano ante a natureza. Ilya Prigogine seguirá no trilho desta ciência em pleno desenvolvimento consolidando um novo campo de estudo: a termodinâmica de não-equilíbrio. Laureado com o Prêmio Nobel de Química em 1977 pela sua Teoria das Estruturas Dissipativas, Prigogine abre um novo capítulo da história e filosofia da ciência.
Neste dossiê, organizamos uma coletânea de dez artigos referentes ao pensamento prigoginiano. São pouquíssimos os trabalhos em português que encontramos a respeito deste físico e químico eminente. Os dez artigos tratam de forma geral sobre a repercussão das ideias de Prigogine em todo campo do conhecimento humano. Como verão, os pesquisadores e pesquisadoras utilizam as ideias para desenvolver respectivamente os campos associados às suas formações. Seja em biologia, química, física, filosofia ou história, o pensamento prigoginiano atravessa.
Finalmente, ressaltamos que é fundamental municiar-se de uma leitura dialética para o contexto de toda obra de Ilya Prigogine a fim de que não ocorram entendimentos equivocados, como o de Marcel Novaes no artigo “Ilya Prigogine: uma visão crítica”, publicado na Revista Brasileira de Ensino de Física em 2010.

00. ESCULPIR O ESPAÇO-TEMPO
(Claude Bergson)
01. UMA CONTRIBUIÇÃO À FILOSOFIA DA CIÊNCIA
(Neusa Teresinha Massoni)
02. A CIÊNCIA COMO BIFURCAÇÃO
(Maria da Conceição Almeida)
03. CRIATIVIDADE DA NATUREZA
(Ilya Prigogine)
04. ENTRE O TEMPO E A ETERNIDADE
(Jorge Albuquerque Vieira)
05. A HISTORICIZAÇÃO DA FÍSICA
(Rodrigo França Carvalho)
06. POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS
(Várias autoras)
07. UM MUNDO PARA DESCOBRIR
(Ilya Prigogine)
08. UM NOVO DIÁLOGO COM A NATUREZA
(Andressa Liriane Jacobs)
09. UMA BREVE HISTÓRIA DO FIM DAS CERTEZAS
(Katja Plotz Fróis)
10. CARTA PARA AS FUTURAS GERAÇÕES
(Ilya Prigogine)